sábado, 3 de novembro de 2018

Responsabilidades

Nasci nos anos 80 e cresci acompanhando a redemocratização do Brasil. Passei a infância e adolescência ouvindo de todos que minha geração seria o futuro do País, que faríamos a diferença para melhorar a nação. Hoje, aos trinta e seis anos, com o resultado das eleições e com o quadro político nacional, por um instante, coloquei o fardo da mudança na geração da minha filha de nove anos... Por um momento quase me libertei do peso, quase lavei as mãos. Teria cometido o mesmo erro de quem apostou tudo na minha geração. Mas recobrei a razão a tempo. Não adianta jogarmos a responsabilidade pro futuro. Temos que agir agora, ainda dá tempo de mudar. A direita, que saiu vencedora, pode sim, se usar a empatia como norte, fazer um bom trabalho. A esquerda não morreu, restou a verdadeira esquerda, que não deve ser oposição por oposição, tem que ser fiscalizadora até reconquistar a confiança do povo. E nós, que fomos um dia a geração do futuro, é hora de mudarmos o presente, um círculo por vez (família, amigos, trabalho...). Teremos quatro longos anos para nos reinventarmos... Ainda tenho esperança de viver dias melhores!

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Inclusivo ou excludente?

Esse ano conheceremos o verdadeiro rosto do brasileiro médio. Teremos uma oportunidade de autoconhecimento. Dependendo do resultado das eleições, veremos de que tipo de fibra somos feitos. Se inclusiva ou excludente...

Penso assim...

Dizer "penso assim e pronto" fecha uma porta valiosa para o crescimento, a porta da transformação. Através dela podemos diminuir nossa limitação! O voto é o momento, como cidadãos, que nos exige o mais árduo esforço de empatia. Ser solidário ao votar, é ser maduro, é ser sensato!

domingo, 11 de setembro de 2016

Flexibilização da CLT - II

Que tal um exercício de empatia, meu caro amigo funcionário público, estatutário, que defende a flexibilização da CLT? Lembra quando você era funcionário da iniciativa privada, antes de passar no concurso? Era difícil negociar as férias, as horas extras e as folgas com o patrão, não era?! Então, tente se colocar no lugar do funcionário celetista e pare de apoiar quem defende menos direitos aos trabalhadores, pois você está defendendo o aumento do tamanho do chicote que baterá no seu próximo (parente ou amigo). Acorde! Os funcionários públicos também estão na fila para perder direitos. Este chicote, de tão longo, alcançará a todos!

Flexibilização da CLT - I

Então quer dizer que o trabalhador terá a “liberdade” de optar ou não por trabalhar as 12 horas? Quanta ingenuidade, meus amigos! O patrão (lado mais forte), dizendo ao trabalhador (lado mais fraco), que em sua empresa os funcionários terão(!) que trabalhar as 12 horas, quem é que se oporá contra essa decisão, colocando em risco o seu emprego? A exceção se tornará regra, caros colegas, isso é o que a flexibilização da CLT trará...

domingo, 29 de maio de 2016

Hora de Acordar

Levante-se!
Não permita que te subjuguem.
Cante a canção do homem,
grite a canção da vida!
Cante, grite!
Tua canção é digna de ser ouvida...
Levante-se!
Deixe a ira ser vista nos teus olhos.
Não permita que cortem a última árvore do teu bosque,
a última flor do teu jardim!
Não se cale...
Cante, grite!


Terra

Terra...
A árvore da vida em chamas.
Fogo refletido nos olhos da índia que esqueceu seu nome.
Nos olhos ferozes de quem a tudo um nome novo dá!

Terra...
A benção onde germinam sonhos.
Desejos usurpados e violentados pelo latifúndio.
Ferida aberta. Adubo feito com sangue e lágrimas camponesas!


Fome

Que fome que corrói as entranhas da minha mente...
Quero ingerir uma prosa orgânica e versos calóricos.
Insaciavelmente quero degustar sonetos!
Devoro livros, sorvo poemas...
Meu cálice nunca está vazio, ao contrário!
Transborda vinhos de telas tintas,
licores de aromas esculturais.
Tenho a arte como maná, como panaceia.
Perto de mim vejo Baco em uma vinícola de ideias e
Ceres em plantações de sonhos...
Prossigo insatisfeito, faminto!

Recomeçar

Um recomeço e seu primeiro passo...
Pés descalços a tocar a incerteza, terra tão fria!
Um segundo passo, novos calos...
Já é tempo de correr.
Corre menino, corre!
O mundo urge em lhe rever.

Amadurecer

Aqui, como que desgarrado de mim mesmo.
Sem arrependimentos, sem certezas... nada importa!
A voz ecoa no vazio entorpecido,
a mente se abstrai, o suplício já não fere tanto.
Acalmo meus olhos, repouso as mãos.
A música preenche os espaços e hiatos...
Nada mais de tatear o escuro,
caminharei guiado pelo som do vento,
minha única realidade.

Escolhas

O tempo finge ser um pai compreensivo:
Vá filho, és livre, siga o teu caminho.
Tempo, tempo...
Nem pai, nem amigo.
Apenas um implacável punidor!

Ilusão

Sorrisos escondidos no tempo, amargos por trás dos dentes.
Não confortam, não correspondem, murcham as folhas.
A última pá de cal...

Olhares soltos ao vento, chocando-se contra as paredes.
Ninguém os colhem, são semeados nas rochas.
Queimam sob a luz do sol...

Mãos no peito se perdendo, procuram todos os prazeres.
Tocam, se entregam, ferem, inimigas, mentirosas...
O inicio de todo mal...

Epifania

Aqui, onde a estrada finda,
não faz diferença olhar para a esquerda ou direita.
O peso fica suportável, possibilita a grata visão do todo!
Eternizar-se em palavras e princípios?
Convicções tão sólidas? Tolice!
Tudo dissipa-se na mais suave brisa...

Dicotomia

Sempre flertei com a inconstância.
Hoje quente, amanhã frio.
Hoje não, amanhã sim!
As incertezas duelam com as afirmações.
A boca nega, os olhos confirmam.
Falta-me a passividade do meio,
do morno, do talvez...

Meus trinta e poucos anos

A alvorada da vida, o despertar...
O sangue ferve nas veias,
chega à boca com gosto de vinho,
esquenta o corpo como ferro sendo forjado!
O entardecer, tudo se acalma...
Os pensamentos estão cansados,
os rostos já não são mais tão atraentes,
os sorrisos escondem o que os olhos não negam!
É o anoitecer da alma...
Aí, uma nova manhã vem!
Trás novas possibilidades,
certezas de infinitos recomeços,
sorrisos recíprocos e verdadeiros.
Nota que ainda há beleza...
O caminhar volta a ser firme, os passos largos!
Os sonhos estão livres, as quedas não doeram tanto...
Afinal, não se passou tanto tempo assim!

CRIAR

CRIAR I

Luto e ressurreição das ideias.
Perco-me. Reencontro-me.
A pena está muda,
os versos deslizam entre os dedos,
a poesia nasce entre espinhos.
Vi de longe o ideal...
Quis tocá-lo, veementemente afirmá-lo!
Mas as mãos se perderam
e os lábios não conseguiram...

CRIAR II

Prosas e poesias em sono profundo.
A liberdade do papel e caneta apresentada...
Punho firme, papel ferido, intimidade exposta.
Que pena. Sangue em vão! Nada de novo ocorre.
Volto aos sonhos e ao papel em branco.

sábado, 28 de maio de 2016

Renovar-se

O vento sopra mudanças lá fora,
clima propício ao devaneio.
Hora de romper com o óbvio e flertar com o novo...
Nada mais de desejos ocultos pela noite!
Inspiro o fardo do dia e expiro a leveza de uma manhã de sol.
Tudo parece bem, todos há de serem bons...

E Hoje? Libertar-se...

Hoje os amigos não estarão presentes,
olhares não se encontrarão.
Sorrisos de aprovação? Não, hoje não!
Apenas o caminho, suas pedras e a poeira do tempo...
Hoje os amigos não erguerão suas taças,
nada de ombros ou abraços.
A opção pela liberdade é uma porta aberta, mas passarás sozinho por ela... irás à rua?
Em casa ou lá fora, traçarás o vosso destino...
Seguir a todos ou tentar um passo diferente?
Desafiam-te os olhos acusadores, cenhos franzidos.  
Quem és? Como permitir-se tudo?
Ora, a liberdade não é recompensa, é responsabilidade!
Irás lá fora? A porta ainda está aberta.
Se fores, reconhecerás alguém e juntos receberão uma sentença...
Absolvição, culpa, quem sabe?
As respostas virão, mas vocês já estarão longe...




sexta-feira, 27 de maio de 2016

Nós entre os 30...

O ser humano passa a vida toda amando e sendo amado, mudando de relacionamentos (monogâmicos ou poligâmicos) e muitas vezes não chega nem perto de ter 30 parceiros sexuais durante toda a sua existência. Estamos falando de relacionamentos ou parcerias sexuais onde a regra é o amor, o carinho e o consentimento. Pois é meus amigos, essa moça foi ESTUPRADA por mais de 30 homens em uma única noite! ESTUPRO, onde a regra é a violência, o desprezo pela vítima e a força. Tamanha brutalidade e bestialidade só são comumente vistas em tempos de guerra! É para todos ficarmos chocados mesmo! Todos temos que discutir, escrever, comentar e lutar até que a cultura do estupro acabe! Principalmente nós homens, pois somos os principais culpados e disseminadores desse mal. Sim, fazemos parte desses 30 monstros! Quando colocamos a culpa do estupro na vítima, quando dizemos que ela mereceu ou quando afirmamos que o fato não teria ocorrido se ela estivesse em casa ou na igreja. Mesmo nas pequenas atitudes do dia a dia nós fazemos parte desses 30 canalhas. Nos nossos machismos diários, inferiorizando as mulheres, quando as agredimos, as ofendemos pelo tamanho de suas roupas, as coagimos nas baladas e criticamos suas lutas e ideais feministas... São tempos difíceis, elas estão realmente em guerra! Só não podemos deixá-las guerreando sozinhas. Temos todos que combater o bom combate, homens e mulheres juntos contra a cultura do estupro, diariamente, pois é o bem maior que está em jogo, a VIDA!

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Luto ou Lutar?

Não vou ficar aqui torcendo pelo pior! O “EU AVISEI” me parece muito egoísta e cheio de ego em algumas ocasiões. Não é doce como um "EU TE AMO" ou sincero como um "ME PERDOA", ao contrário, é amargo e cheio de angústia. Tenho uma filha para criar e prezo muito pelo futuro dela. Para isso o Brasil precisa de estabilidade política e econômica, mas também não vou me calar ante as aberrações da nossa política. É pelo futuro delas, as crianças, que não podemos fechar os olhos, temos sim que discutir e repensar. A motivação da derrubada da Dilma não foi a retomada da ética e o combate à corrupção? Não era essa a bandeira que todos levantaram nas ruas? Pelo jeito para Temer (que está inelegível) não é bem assim. Teve a oportunidade de escolher um ministério técnico, sério e voltado para o crescimento do Brasil, mas não o fez! Loteou o país como todos os outros fizeram antes (PSDB e PT). Dividiu as pastas entre os novos aliados do PMDB apenas para satisfazer os seus interesses pessoais. Alguns dos escolhidos estão inclusive sendo investigados pela operação laja-jato, como: Romero Jucá, que assume o Planejamento; o ex-deputado Henrique Eduardo Alves agora no Turismo; o ex-ministro da Integração Nacional Geddel Vieira Lima que está na Secretaria de Governo; Bruno Araújo que assume as cidades e Ricardo Barros na Saúde. As nossas escolhas dizem muito sobre o que nós somos e o que pensamos. Não me parece uma boa escolha para combater a corrupção. Está claro que é apenas o poder pelo poder, senão nas urnas, na marra... E agora? O que esperar? Talvez piore, talvez melhore. Torço pelo melhor, temos que torcer pelo melhor. É o nosso futuro que está em jogo! Até pedirei desculpas futuramente pelas palavras ferinas se eu estiver errado, pois só não quero ter que dizer, com gosto de fel na boca, “EU AVISEI”. 

terça-feira, 22 de março de 2016

O início da escuridão...

Estamos acompanhando nos noticiários várias manifestações de ódio contra a esquerda brasileira (não necessariamente o PT) e contra as minorias. Essa crescente onda de intolerância, ainda escondida pelos becos e na calada da noite, de forma covarde contra quem ousa trajar vermelho num passeio noturno é a face oculta de um desejo radical que cresce no coração da direita extremista... Sabemos muito bem no que isso pode dar. Estamos de olho!

quinta-feira, 17 de março de 2016

Quanto mais confuso melhor... Pare eles!

Momento confuso em nossa política nacional: a Presidente Dilma usa um cargo para tentar livrar o amigo Lula da justiça (mesmo que temporariamente); a justiça na figura do Juiz Moro usa a imprensa para causar instabilidade divulgando escutas ilegais. Estamos diante de um governo que quer ser maior que a justiça e de uma justiça parcial que quer ser política. Se continuar assim, esse governo que não dá para apoiar e essa oposição em forma de sentença judicial, irão transformar o Brasil em um Estado Policial sem a intervenção das forças armadas!

quarta-feira, 16 de março de 2016

A busca pela ética

Nosso momento político é controverso. Está muito difícil acertar um lado certo... Que tal focarmos então nos nossos princípios? Aqueles ensinados pelos nossos pais e pelos professores do primário. Se pensarmos bem não é difícil de lembrar. Independentemente de partido, vamos tentar mudar o país? Que acham? Não apenas no planalto, mas no cotidiano. Vamos todos dizer diariamente,  assim como nos Narcóticos Anônimos: só por hoje eu vou ser honesto; só por hoje não vou furar fila; só por hoje não vou tentar levar vantagem; só por hoje não vou subornar o funcionário público... Um dia por vez. Uma luta diária contra nós mesmos e contra o "jeitinho". Todos nós iremos mudar. O Brasil vai mudar. Há outra forma de forjar um futuro melhor?

domingo, 13 de março de 2016

O povo nas ruas

Hoje muitos amigos foram pras ruas protestar. Amigos queridos, pessoas de bem que realmente querem ver o Brasil mais justo. Com esses amigos, grandes amigos, eu iria de peito aberto combater o bom combate! Mas como me calar ante a tanta atrocidade e hipocrisia que vi? - Aécio Neves nos braços do povo, pedidos de intervenção militar, Jair Bolsonaro sendo chamado de mito, desfiles de políticos oportunistas - Alto lá meus amigos, não tem algo estranho aí? É bom ver o povo brasileiro pintando as ruas de verde e amarelo, gritando palavras de ordem e tentando mudar o país, mas me parece que o que começou em junho de 2013 foi pervertido e virou um desfile de moda, algo manipulado pela direita coxinha, bem diferente da espontaneidade das “Manifestações de Junho”. Por isso não fui... Agora, se forem derrubar o governo, todos os governos em todas as esferas de poder (municipal, estadual e federal), em uma revolução que culmine com a queda dessa nossa velha e desgastada política, podem me chamar que eu vou, pois aí sim haveria mudança!

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Quando jogar a pedra...

Procuro sempre olhar as situações com certo distanciamento, tentando enganar a minha condição humana e ser imparcial nas minhas posições. Talvez agora eu não consiga e caia no erro da parcialidade, por isso aceito as opiniões dos amigos. Quando vejo as batalhas travadas entre manifestantes e policiais nas ruas, acabo ficando pesaroso. Dividido entre a tristeza e a vergonha, principalmente quando as manifestações são reprimidas com violência. Contudo, sempre que vejo as pedras sendo arremessadas em direção aos policiais, penso que o manifestante errou a mira. Deveria tê-la jogado com um pouco mais de força! A pedra deveria passar por cima desse escudo do Estado, que é feito de carne e osso, e continuar voando, como se tivesse vida própria, abandonando sua condição de mineral e, organicamente, com a fúria de uma nação enganada, acertar o teto de vidro de algum político corrupto. Mas é sempre ação e reação. Manifestação X Polícia. Pedras X Cassetetes. Que pena tanta energia ser canalizada uma contra a outra, enquanto quem saqueia o país vê tudo pela TV. Além da parcialidade, vou me permitir um segundo erro neste texto, a utopia: Seria muito bonito ver coturnos e tênis caminhando na mesma direção, lado a lado, com o mesmo objetivo. Os políticos brasileiros tremeriam...

quarta-feira, 28 de maio de 2014

A ARQUEOLOGIA HISTÓRICA EM RONDÔNIA E O PATRIMÔNIO QUE NOS FOI LEGADO – O DEBATE PATRIMONIAL


Aluno: Pedro Pedroza Cardoso – agente_pedroza@yahoo.com.br
Fundação Universidade Federal de Rondônia - UNIR
Curso de Bacharelando em Arqueologia - 7º Período
 Cadeira de Arqueologia da Floresta Tropical
 Professor Carlos Augusto Zimpel


Resumo

Este trabalho tem a intenção de colaborar com a compreensão da Arqueologia Histórica de Rondônia e ainda abrir uma oportuna discussão acerca do descaso com que é tratado o patrimônio histórico cultural do Estado. Salienta ainda questões acerca do passado recente dos nossos habitantes, bem como a difícil e conflitante interação entre os povos indígenas e os exploradores e colonos que por aqui passaram e se instalaram, formando vilas e cidades dentro da floresta amazônica. Enfatizamos também que esta pesquisa procura contribuir com o fortalecimento da nossa identidade social, pois tenta alertar os Rondonienses sobre a importância de conhecermos nosso passado recente, para que assim possamos respeitá-lo, passando a consciência e desejo de preservação dessas riquezas culturais para as gerações vindouras.


Palavras-chave: Arqueologia Histórica. Preservação do Patrimônio. Identidade Cultural.


1 – Introdução

         É notório que o Estado de Rondônia possui inúmeros patrimônios históricos que necessitam urgentemente de serem estudados e pesquisados mais profundamente, bem como  restaurados, preservados, musealisados e, em muitos casos, apresentados à população.
            Escolhemos três temáticas principais para esta discussão: O Real Forte do Príncipe da Beira (localizado na cidade de Costa Marques, às margens do Rio Guaporé), As Linhas e Postos Telegráficos (deixados pela Comissão Rondon, restando apenas dois postos  localizados nas cidades de Vilhena e Ji-Paraná) e A Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (estendendo-se da Capital Porto Velho até a cidade de Guajará Mirim), que de longe são os nossos principais e mais conhecidos patrimônios históricos, porém não menos abandonados e frutos do descaso do Poder Público.


2 – O Real Forte do Príncipe da Beira – Breve Relato Histórico

            O Real Forte do Príncipe da Beira, também conhecido como A Fortaleza do Príncipe da Beira, que está situado na margem direita do Rio Guaporé, na cidade de Costa Marques – RO, encontra-se em posição privilegiada na fronteira com a República da Bolívia e é considerada uma das maiores fortalezas edificadas no Brasil durante o período colonial.
            “Com um perímetro de 970 metros, muralhas de dez metros de altura e quatro baluartes, onde encontramos um total de 56 canhonetas, o Real Forte do Príncipe da Beira representava a onipotência da Coroa Portuguesa” (Oliveira, 2004).

 
Figura 01 – Real Forte do Príncipe da Beira 
Fonte - www.pordentrodamidia.com.br

           
            Em meados do século XVIII, com o intuito de assegurar o domínio sobre o Vale do Guaporé e também o contínuo fluxo de navegação fluvial, bem como eliminar as pretensões de Espanha sobre a área, a Coroa Portuguesa resolveu construir um forte militar estratégico na margem direita do Rio Guaporé, fronteira do Brasil com o Vice-Reino do Peru.
Esta árdua missão ficou sob a responsabilidade do Capitão General Dom Luiz Albuquerque de Melo Pereira e Caceres, então Governador da Capitania de Mato Grosso, que tomou todas as providências para cumprir as ordens de D. José I, rei de Portugal.

“A soberania e o respeito de Portugal impõem que neste lugar se erga um Forte, e isso é obra e serviço dos homens de El-Rei nosso senhor e, como tal, por mais duro, por mais difícil e por mais trabalhoso que isso dê, (...) é serviço de Portugal. E tem que se cumprir.”

D. Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres,  junho de 1776.

Então, aos 29 dias do mês de junho do ano de 1776, foi fixada a pedra fundamental no alicerce do ângulo do baluarte Nossa Senhora da Conceição, que fica na direção do poente, assim sendo oficialmente dado o início da construção sob a responsabilidade do engenheiro militar Domingos Sambocet.
Trabalharam neste empreendimento mais de duzentos operários e artífices de várias especialidades, provindos de Belém e do Rio de Janeiro e ainda centenas de escravos. A obra foi concluída em 1783, pelo Capitão Ricardo Franco de Almeida Serra, que teve que substituir Domingos Sambocet, falecido durante a construção, vitimado pela malária.
As rochas usadas na construção foram encontradas no próprio local e a Cal foi obtida em Belém, Albuquerque e Corumbá. A artilharia é provinda de Lisboa. O Capitão de Dragões foi o primeiro comandante da fortaleza que, além do intuito de assegurar a posse do Rio Guaporé para Portugal, seria ponto de apoio para a contínua expansão lusitana na direção oeste até as minas no Vice-Reino do Peru.
A partir do final do século XVIII, com a consolidação do domínio lusitano sobre a região, o forte perdeu a sua importância estratégica. Em 1864 a fortaleza contava com apenas dez soldados, onde sete deles estavam destacados no Presídio das Pedras. No século XIX foi usado como presídio político, guarnecido com quatorze praças e um tenente. Abandonado à época da Proclamação da República, o forte passou à guarda do Estado do Mato Grosso.
Marechal Rondon, em 1914, visitou as ruínas e efetuou trabalhos de limpeza no local, contudo demorou mais dezesseis anos, ou seja, só em 1930, para que uma nova expedição do Exército as revisitasse, guarnecendo-as novamente dois anos depois com a instalação do Contingente Especial de Fronteira do Forte Príncipe da Beira. (Fonte Ovídio Amélio de Oliveira).


Figura 02 – Marechal Rondon visitando o Forte
Fonte - www.alekspalitot.blogspot.com.br

 
2.1 – O Legado Patrimonial

            Abandonado e vítima de descaso por décadas pelo Poder Público, o Real Forte do Príncipe da Beira, que é um dos marcos mais monumentais da ocupação portuguesa na Região  Amazônica, começou a ser estudado em 2009 para futuramente ser restaurado e musealisado. 



Figura 03 – Ruínas do Real Forte Príncipe da Beira
Fonte - www.globoamazônia.com in www.injipa.com.br


Um projeto de recuperação de fortificações do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) permitiu conhecer de forma mais esclarecedora como era a rotina no Forte. Milhares de artefatos foram encontrados nas escavações da parte interna. Os trabalhos foram realizados por uma equipe composta por arqueólogos, biólogos, engenheiros e arquitetos especialistas em construções do século 18, pesquisa desenvolvida por Fernando Marques, Arqueólogo do Museu Paraense Emilio Goeldi (www.injipa.com.br).



Figura 04 – Unidades Abertas no interior do forte
Fonte - www.globoamazônia.com in www.injipa.com.br

            Segundo o coordenador dos trabalhos, observando os artefatos arqueológicos recolhidos durante as escavações, pode-se observar a interação entre os militares e a população da região, pois foram recolhidas louças europeias misturadas com cerâmicas nativas. Dentro do espaço físico do forte havia uma capela, um hospital, um boticário e nas suas proximidades foram sendo erguidas comunidades.
           

    
Figuras 05 e 06 – Artefatos encontrados durante as escavações
Fonte - www.globoamazônia.com in www.injipa.com.br 
            Infelizmente, após as escavações e recolha do material, novamente o Real Forte do Príncipe da Beira foi abandonado pelo Poder Público, que não deu prosseguimento ao projeto de musealisá-lo, alegando falta de condições financeiras.


3 – As Linhas e Postos Telegráficos de Rondon – Breve Relato Histórico

As expedições na Amazônia no fim do século XIX e princípio do século XX surgiram da necessidade de integrar as regiões pouco exploradas do Brasil, devido a isso o governo brasileiro iniciou uma política de ocupação e povoamento. Essa política abrangia uma grande região, desde o Mato Grosso ao Amazonas. A ideia era colonizar estas áreas com população não indígena, construir estradas, educar os índios, instalar meios de comunicação, etc.
Com este intuito o Exército reorganizou em 1880 o Batalhão de Engenheiros, que se dedicava à construção de linhas de caminhos de ferro e de linhas telegráficas. O Marechal Rondon pertenceu e chefiou algumas das comissões criadas para a construção das linhas telegráficas.
As expedições realizadas permitiam ainda explorar geográfica e cientificamente regiões vastas e desconhecidas. Neste âmbito, o antropólogo Edgar Roquette-Pinto, acompanhou a Comissão Rondon, tendo documentado a parte científica, ao debruçar-se essencialmente sobre as tribos Parecí e Nambiquarás.
Em 1900, Cândido Mariano da Silva Rondon, jovem oficial do Exército, tornou-se chefe da Comissão de Linhas Telegráficas do Estado do Mato Grosso e, em 1907, comandou a Comissão de Linhas Telegráficas do Mato Grosso ao Amazonas. Sendo ela conhecida como Comissão Rondon, que aconteceu entre 1907 e 1915.
Os principais objetivos eram a integração dessas áreas desconhecidas à nação brasileira, expandir a autoridade do Estado Central e o reconhecimento, demarcação de terras, exploração dos rios, entre outros.
Durante um discurso em que demonstra ser partidário de Getúlio Vargas, Rondon expressa claramente qual era a visão e política do Governo para com a Amazônia:

"Por este conduzir a bandeira política e administrativa da Marcha para o Oeste, visando ao alargamento do povoamento do sertão e de seu aproveitamento agropecuário com fundamentos econômicos mais sólidos e eficientes. Homenagem pela sua expressão de simpatia para com os indígenas e disposição de ocupar o vazio do território que permanecia despovoado."

Rondon e sua comissão, formada por botânicos, zoólogos, antropólogos, geógrafos, entre outros especialistas, investigaram, analisaram e constataram o clima, as doenças, rios, plantas, animais, o solo, a agricultura e todas as condições dos lugares. Além disso foram construídos aproximadamente 4.500km de linhas telegráficas,  55 estações,  construção de estradas, pontes, e principalmente, a elaboração de mapas de lugares, ate então desconhecidos.
           


Figura 07 – Comissão Rondon 
Fonte - www.comissaorondon.blogspot.com


Logo após a conclusão da rede de linhas telegráficas do Mato-Grosso ao Amazonas, surgiu o rádio, que de imediato suplantou por completo o lugar do telégrafo nas comunicações.
A Comissão teve grande importância em se tratando de desenvolvimento científico e comunicação viária, contudo são conhecidos depoimentos de índios parecís que afirmam que foram vítimas do desenvolvimento das linhas telegráficas, uma vez que seu território foi adulterado e de certa forma foram forçados a integrar-se na “civilização”, com o sacrifício da identidade cultural. (Fonte Abnael Machado de Lima).


3.1  – O Legado Patrimonial

No caminho aberto pela linha telegráfica nasceram povoações que anos mais tarde tornaram-se municípios, como: Vilhena, Pimenta Bueno, Cacoal, Presidente Hermes (hoje Presidente Médice), Presidente Pena (hoje Ji-Paraná), Jarú e Ariquemes.



Figura 08 – Localização dos Postos Telegráficos no Estado de Rondônia
Fonte - Abnael Machado de Lima


Todas estas localidades abrigaram postos telegráficos, que nos dias atuais, ou foram totalmente destruídos, ou estão em péssimo estado de conservação.


   
Figuras 09 e 10 – Postos Telegráficos de Vilhena e Pimenta Bueno 
Fonte - www.amazôniadagente.com.br


   
Figuras 11 e 12 – Postos Telegráficos de Ji-Paraná e Jaru
 Fonte - www.puraverdade.com.br


Dos dezesseis postos telegráficos edificados por Rondon no Estado de Rondônia, apenas dois sobreviveram ao tempo e ao abandono, sendo eles os que foram instalados nos municípios de Vilhena e Ji-Paraná. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) realizou a instrução do processo de tombamento nº 1055- T – 82 destas antigas estações telegráficas, que serão restauradas, revitalizadas e musealisadas.


4 – A Estrada de Ferro Madeira-Mamoré – Breve Relato Histórico

            Também conhecida como a “Ferrovia do Diabo” devido as grandes perdas humanas que aconteceram no período de sua construção. A EFMM foi construída no período de 1907 a 1912, com a finalidade de ligar Porto Velho a Guajará-Mirim, para o escoamento da borracha da amazônica brasileira e boliviana.



Figura 13 – Mapa da Ferrovia 
Fonte  - www.vfco.brazilia.jor.br


O projeto “Madeira-Mamoré Railway” foi apresentado com a intenção de solucionar o problema de uma falta de passagem sobre o rio Madeira, na época em que o Brasil, através do Tratado de Petrópolis, adquiria a posse sobre as terras que hoje pertencem ao estado do Acre.
Este projeto teve como objetivo dinamizar a distribuição da borracha amazônica boliviana e brasileira até a cidade de Porto Velho, que daria origem a um ponto de escoamento. Saindo de Porto Velho, a borracha, bem como outras tantas mercadorias, seguiriam a rota fluvial pelo rio Madeira e também pelo rio Amazonas até chegarem ao oceano Atlântico.


 Figura 14 - Porto Velho surgiu com o movimento causado pelo porto na época da construção
(foto Danna Merryl)


Após duas desastrosas tentativas de construção da ferrovia no século XIX, ela recebeu volumosas somas de dinheiro do empresário norte-americano Percival Farquhar. Havia até o mito de que mesmo com todo o dinheiro do mundo e metade da população empenhada na obra, seria impossível construí-la. Mas Farquhar aceitou o desafio e afirmou:

“(...) vai ser o meu cartão de visitas”

Foi finalizada em 30 de abril de 1912, data que também marcou a fundação da cidade de Guajará-Mirim, contudo muitos trabalhadores pereceram durante a sua contração, vítimas de acidentes de trabalho e de inúmeras doenças tropicais.


Figura 15 – Pacientes no Hospital da Candelária 
(Foto Danna Merryl)


Com a decadência da borracha brasileira, em decorrência do plantio da seringueira na Ásia, a ferrovia também entrou em crise. Nos anos 30, a Estrada de Ferro foi parcialmente desativada.
Em 25 de maio de 1966, após 54 anos de atividades, a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré teve sua desativação determinada pelo então Presidente da República Humberto de Alencar Castelo Branco, para ser substituída por uma rodovia, para que não houvesse o rompimento e descumprimento do Tratado de Petrópolis.
E em 10 de julho de 1972 as máquinas apitaram pela última vez, ficando assim a ferrovia no abandono por muitos anos, tendo parte do seu acervo vendido como sucata para uma empresa siderúrgica de Mogi das Cruze, São Paulo. (fonte Fernando Rebouças).


4.1 – O Legado Patrimonial

            Em 10 de novembro de 2005 a nossa histórica ferrovia foi tombada pelo (IPHAN) e em 28 de dezembro de 2006, o Ministério da Cultura homologou, através da Portaria 108, o tombamento da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré como Patrimônio Cultural Brasileiro.

“DOU 19.07.2007

Define os critérios para controle de intervenções sobre o conjunto Histórico, Arquitetônico e Paisagístico do Pátio Ferroviário da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, na Cidade de Porto Velho/RO, tombado pelo IPHAN nos termos do Decreto-Lei nº 25/37, e dá outras providências. 

O PRESIDENTE DO INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL - IPHAN, no uso das atribuições que lhe confere o inciso V do art. 21 do Decreto nº 5.040, de 07 de abril de 2004, e considerando:

Que o Conjunto Histórico, Arquitetônico e Paisagístico da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM), formado pelo Pátio Ferroviário, os oito quilômetros de estrada de ferro que vai da Estação Central até a Estação de Santo Antônio, as três Caixas d'água e o Cemitério da Candelária, na Cidade de Porto Velho-RO, em razão de possuírem um excepcional valor cultural, são monumentos integrantes do Patrimônio Cultural Brasileiro, na forma e para os fins do Decreto-Lei 25/37 e do Processo IPHAN no- . 1220-T-87;”

Assim, o IPHAN autorizou, em novembro de 2011 o início das obras de restauração da grande oficina da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, que possui 5.700 m2 e 13 metros de altura, contudo ainda há um grande descaso com o patrimônio da EFMM, como atestam as fotografias a seguir:



 
Figuras 16 e 17 – locomotivas e ponte de metal abandonadas 
Fonte - www.gentedeopiniao.com.br

 
Figuras 18 e 19 – Mobília da EFMM empilhada em uma caminhão e túmulo do Cemitério da Candelária
Fonte - www.rondoniaovivo.com


5 – Considerações Finais

            Todas estas imagens, fotografias e mapas que vimos ao longo do desenvolvimento deste trabalho, apontam e comprovam o grande descaso e irresponsabilidade do Poder Público para com o patrimônio histórico material do Estado de Rondônia. Há uma perturbadora falta de zelo para com os símbolos que representam a formação desse estado que possui uma das histórias e culturas mais interessantes do país.
Estamos presenciando tempos de constantes transformações e “desenvolvimento” econômico que, banhados pelos ideais capitalistas, fecham os olhos para o nosso patrimônio histórico material e imaterial, objetivando apenas o lucro pelo lucro. Uma irracional rejeição ao dito “velho”, como se impedisse e atrasasse o progresso, mas muito pelo contrário, auxilia e impulsiona-o.
Claramente não está sendo levado em conta que este progresso é vazio se não tiver como base o respeito à memória e à cultura do povo que, constantemente mantido às escuras pelos governantes, sem uma devida e extremamente necessária educação patrimonial, torna-se gado e massa de manobra.             Uma das maneiras mais eficazes de despertar o interesse de uma população para a sua história é o estímulo e incentivo que ocorre por meio de uma educação patrimonial. Porém uma educação patrimonial demagógica, de discursos memorizados não funciona, as questões patrimoniais devem estar vivas e presentes nas escolas, nas empresas, nas conversas de bares, nas passeatas, no dia-a-dia da nação. Quando um povo não dispõe desta ferramenta para manter vivo esse interesse, os acontecimentos importantes e os rotineiros vão ficando apenas nas narrativas e tradições orais daqueles que presenciaram àquelas situações e infelizmente morrem com eles.
Não cuidar do passado de um povo é um crime muito cruel, é alienar o mais fraco, é subjugar aquele que não sabe se defender e que muitas vezes nem sabe da necessidade de se defender. Por isso precisamos obrigar urgentemente que nossos representantes políticos tornem a preservação ao patrimônio uma prioridade, assim como a educação, a saúde, a seguranças, o lazer, etc., pois um país que preserva e respeita a memória de seu povo, forma criadores e não apenas meros espectadores, chama as pessoas a refletirem sobre as suas realidades. Movimenta, Cria, Muda!

  
6 – Bibliografia Consultada

BARBOSA, Francisco de Assis; NUNES, José Maria de Souza. Real Forte Príncipe da Beira. Rio de Janeiro: Spala Editora/Fundação Emílio Odebrecht, 1985.

FARIA, Miguel. Príncipe da Beira: a fortaleza para além dos limites. Lisboa: Revista Oceanos, nº 28, out.-dez/1996, p. 54-68.

FARIAS, Marcello. Príncipe da Beira, um forte de grande importância na consolidação da nossa fronteira. s.l.: Revista Nacional, nº 229, Semana Ilustrada, p. 9.
FERREIRA, Arnaldo Manuel de Medeiros. Fortificações Portuguesas no Brasil. Lisboa: Elo/Círculo das Letras, 2004. p. 135.

GARRIDO, Carlos Miguez. Fortificações do Brasil. Separata do Vol. III dos Subsídios para a História Marítima do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Naval, 1940.

MENDONÇA, Marcos Carneiro de. "O Caminho do Mato Grosso e as Fortficações Pombalinas da Amazônia". RIHGB, Rio de Janeiro, vol. 251, abr/jun de 1961, p. 3-32, mapas.

OLIVEIRA, José Lopes de (Cel.). "Fortificações da Amazônia". in: ROCQUE, Carlos (org.). Grande Enciclopédia da Amazônia (6 v.). Belém do Pará, Amazônia Editora Ltda, 1968.

OLIVEIRA, Ovídio Amélio de. Geografia de Rondônia – Espaço e Produção. Porto Velho. Editora Dinâmica, 2005.

__________________________. História – Desenvolvimento e Colonização do Estado de Rondônia. Porto Velho. Editora Dinâmica, 2004.

Revista História Viva, nº 14, pg 30-41. "Dossiê Madeira-Mamoré". Editora Duetto. São Paulo. (2004).

s.a. Histórico do Real Forte Príncipe da Beira (2ª ed.). Porto Velho (Brasil): Governo do Estado de Rondônia; Secretaria de Estado de Cultura, Esportes e Turismo; Departamento de Cultura, 1983. 22 p. il.

TEIXEIRA, Marco Antônio Domingos e FONSECA, Dante. Rondônia – História Regional, 1997.

A ANTROPIZAÇÃO PRÉ-HISTÓRICA DA PAISAGEM AMAZÔNICA: O MANEJO HIDRÁULICO NO CACICADO DOS CAMUTINS


Aluno: Pedro Pedroza Cardoso – agente_pedroza@yahoo.com.br
Fundação Universidade Federal de Rondônia - UNIR
Curso de Bacharelando em Arqueologia - 6º Período
 Cadeira de Arqueologia Amazônica II
 Professor Carlos Augusto Zimpel


Resumo

Esta pesquisa procura contribuir para a construção do saber científico, pois salienta interessantes questões acerca do passado remoto dos povos amazônicos. Voltando nossos olhos especialmente para os indígenas que viveram na ilha de Marajó e que formaram vários cacicados, como o dos Camutins (sítio arqueológico composto por 34 aterros localizado ao longo do Rio Camutins), onde os seus habitantes eram extremamente habilidosos no manejo hidráulico do rio, podemos entender os indicadores de complexidade social que são de suma importância para o estudo de cacicados, como a hierarquização, a militarização, a centralização política, a legitimidade, a especialização e controle sobre a circulação de bens de prestígio, entre outros (Earle, 1991). Enfatizamos também que este trabalho colabora com a formação de nossa identidade social, pois procura conscientizar os brasileiros acerca da importância de conhecermos nosso passado, para que assim possamos respeitar e preservar os vestígios dessas culturas há muito perdidas, que não são apenas um patrimônio nacional, mas também uma fonte de saber.


Palavras-chave: Cacicados. Complexidade Social. Manejo Hidráulico.


1 Introdução

            É notório que, para o desenvolvimento de sociedades complexas, no caso desta pesquisa, o Cacicado dos Camutins, há que existir uma agricultura extremamente produtiva e eficiente que possa sustentar uma razoável densidade demográfica e ainda produzir excedentes que pudessem financiar a especialização de tarefas e uma elite, religiosa ou ideológica.
            Como então explicar o surgimento e desenvolvimento de sociedades complexas e estratificadas na Ilha de Marajó, onde se encontram alguns dos mais pobres e menos adequados solos para a agricultura em toda a bacia Amazônica (Schaan, 2006)?


2 Ilha de Marajó



É chamada de ilha de Marajó a ilha localizada na região norte do Brasil entre os estados do Pará e do Amapá e banhada pelo oceano Atlântico, além dos rios Amazonas e Tocantins. A teoria mais aceita sobre a origem do nome Marajó faz menção às observações dos índios nativos da ilha, que a denominaram de “Mibaraió”, e que em língua tupi significa “anteparo do mar” ou “tapamar”. Com uma área de 40.100 km², Marajó é considerada a maior ilha fluviomarinha do mundo (ou seja, ela é cercada por rios de um lado, e por mar do outro), e maior que muitos países independentes, como por exemplo a Bélgica, que possui 30.528 km². Contando com uma população total de cerca de 250.000 habitantes, sua área está dividida atualmente em 15 municípios, sendo que o principal destes é Soure, com 22 mil habitantes, seguida de Salvaterra com 17 mil habitantes. A ilha destaca-se pela sua paisagem diferenciada, mesmo dentro da região amazônica, e é marcada por praias desertas de água salobra, igarapés e búfalos por toda a parte. Originário da Ásia, o búfalo chegou por volta de 1890, e se multiplicou rapidamente, a partir de importação de exemplares da raça carabau, originária das Filipinas. Gradualmente estes se tornaram símbolos da ilha, sendo vistos em grandes manadas nas extensas planícies ou dispersos nas modestas áreas urbanas, onde são usados como táxi e montaria para a polícia. É em Marajó que se encontra o maior rebanho do animal no Brasil, com cerca de 700 mil cabeças, cerca de três vezes a população de todos os seus municípios.
O clima é marcado por chuvas constantes, e devido ao imenso volume, todo o seu terreno permanece alagado. Grande variedade de peixes e pássaros se fazem presentes no seu ecossistema, com destaque para o guará, uma ave típica de penas vermelhas. Em determinada época do ano é possível observar em seu litoral o fenômeno da “pororoca”, que é o encontro das águas fluviais e marítimas.
Marajó foi habitada antes da chegada dos portugueses por nações indígenas com sociedades bem avançadas e que produziram uma arte de considerável beleza plástica e certo renome, a chamada arte marajoara. Acredita-se que a ilha de Marajó foi explorada pelo navegador lusitano Duarte Pacheco Pereira em 1498, antes mesmo do resto do Brasil. Por pensar estar pisando em território espanhol, sua exploração teria permanecido em segredo. Os indígenas locais a chamavam Marinatambal, mas já estava desocupada ao tempo da exploração europeia. No período colonial passa a ser denominada ilha Grande de Joannes, para receber seu atual nome à época da independência, no século XIX. (fonte Infoescola)


Figura 1 – Ilha de Marajó - Imagem Google Earth


3 Cacicados da Amazônia

            O aumento demográfico das populações amazônicas na época da Pré-História tardia, combinado a outros fatores, suscitou grandes transformações entre as sociedades indígenas da Amazônia (John Roach). Segundo arqueólogos, as sociedades que habitavam regiões da bacia amazônica passaram a se organizar de forma cada vez mais elaborada entre o ano 1000 a.C. e o ano 1000 d.C. (Cunha, 2008). Os arqueólogos definem estas sociedades como “cacicados complexos” (Roosevelt, 1997). Essas sociedades tornaram-se cada vez mais hierarquizadas (provavelmente contendo nobres, "plebeus" e servos cativos), constituíram chefias centralizadas na figura do cacique, e adotaram posturas belicosas e expansionistas. O cacique, além de dominar amplos territórios, organizava continuamente seus guerreiros visando conquistar novos territórios. A cerâmica dessas sociedades era altamente elaborada, demonstrando um domínio de técnicas complexas de produção. Havia urnas funerárias elaboradas (associadas ao culto dos chefes mortos), comércio e os indícios arqueológicos apontam uma densidade demográfica de escala urbana nessas civilizações. Acredita-se que a monocultura era praticada, além da caça e da pesca intensivas, a produção intensiva de raízes e o armazenamento de alimentos. Segundo a pesquisadora Anna Roosevelt, "O desenvolvimento da agricultura intensiva nos tempos pré-históricos parece ter estado correlacionado à rápida expansão das populações das sociedades complexas. Sugestivamente, os deslocamentos e o despovoamento do período histórico aparentemente fizeram com que estas economias retornassem aos padrões de cultivo menos intensivo de raízes e à captura de animais (...)."(Roosevelt, 1997).



Figura 2 – Vaso Tapajó denominado “Vaso de Cariátides”.
Fonte - www.historiaparafazer.blogspot.com.br/p/historia-da-amazonia_30.html

Crônicas do início do período colonial são hoje empregadas na reconstrução das antigas civilizações brasileiras. Muitos cronistas estrangeiros descreveram elementos indígenas do período dos cacicados complexos. A dissolução dessas organizações sociais normalmente é relacionada à conquista, que teria abalado sua estrutura demográfica.





Figura 3 – Urna Funerária da fase marajoara.
Fonte - www.commons.wikimedia.org/wiki/File:Funerary_vessel_Collection_H_Law_172_n1.jpg 

A cerâmica produzida por estas civilizações é classificada em dois grupos principais: o Horizonte Policrômico e o Horizonte Inciso Ponteado. Entre os sítios arqueológicos que apresentaram vestígios agrupados sob o Horizonte Policrômico estão: os Marajoaras (foz do Amazonas) e o Guarita (Médio Amazonas), entre outros localizados fora da Amazônia brasileira. Entre os sítios arqueológicos associados ao Horizonte Inciso Ponteado encontram-se: Santarém (Baixo Amazonas) e Itacoatiara (Médio Amazonas). O primeiro horizonte é caracterizado pelas pinturas brancas, pretas e vermelhas, pelos temas geométricos e pelas incisões. O segundo horizonte é caracterizado pelas incisões profundas e pela técnica de ponteação. Acredita-se que o Horizonte Inciso Ponteado estivesse associado aos antepassados dos povos de língua Karib, enquanto o Horizonte Policrômico teria sido produzido pelos antepassados dos povos de língua Tupi.
Os grandes sítios amazônicos da época dos cacicados complexos parecem ter tido regiões especializadas para o enterro, o culto, o trabalho e a guerra. A ocupação pré-histórica tardia do território era sedentarizada. A entrada do milho e de outras sementes na região, assim como sua popularização entre os americanos, data do primeiro milênio antes de Cristo. (Roosevelt, 1997).


4 O cacicado dos Camutins

Trata-se de um sítio Arqueológico composto por 34 aterros localizados ao longo do rio Camutins. Durante as pesquisas, relacionou-se os locais de moradia, cerimônias e festas com as transformações antrópicas da paisagem, estudou-se também as estruturas internas dos aterros cerimoniais, de forma a entender os indicadores de complexidades social considerados críticos para o estudo de cacicados – especialização e controle sobre a circulação de bens e prestígio, hierarquia, centralização política, legitimidade  (ideologia e religião) e militarização.
No sítio foram identificados feições da paisagem relacionadas a um sistema de manejo hidráulico ao longo do rio Camutins, que estava funcionando plenamente em 700 A.D. (Uma barragem e dois lagos conectados ao rio, com capacidade para reter recursos aquáticos). Os conjuntos de artefatos sugerem que uma fonte principal de amido era usada, que pode ter sido obtida de palmeiras ou mandioca. A elite, possivelmente, trocava peixe por alimentos produzidos em outras regiões. As festas podem ter sido oportunidades para a feitura de trocas, assim como um meio para promover a integração e cooperação dentro do grupo social. Não havia grandes diferenças dentro do grupo da elite, isso indica que um grupo corporativo estava no poder. Somente alguns itens de trocas à longa distância foram encontrados e estavam associados com os enterramentos mais antigos escavados.
Itens de troca à longa distância podem ter sido importantes durante o período de maior desenvolvimento do sistema de criação de peixes, mas tornaram-se raros no final da sequência. A cerâmica era produzida para o consumo local dentro do domínio da elite e era uma atividade sazonal. É possível que a produção de poucos itens mais elaborados fosse uma atividade para poucos, mas que não levava à especialização de certos indivíduos no sentido de alijá-los de outras atividades produtivas e criar uma classe especial na sociedade.
Outros cacicados podem ter surgido em locais onde as condições ecológicas favoreceram a reprodução de sistemas de subsistência similares. Estes cacicados certamente interagiram entre si em um sistema que envolvia trocas, alianças matrimoniais e guerras.


4.1 O manejo hidráulico no cacicado dos Camutins

Betty J. Meggers e Clifford Evans, já nos idos de 1957, acertadamente afirmaram que uma sociedade complexa, que teria dado origem a conhecida cultura Marajoara, tinha uma vez existido na Ilha de Marajó, que é parte de um arquipélago localizado no delta do Rio Amazonas, contudo pecaram visceralmente ao negarem o seu desenvolvimento na Amazônia, dizendo que essa cultura parece ter chegado à ilha de Marajó no ápice de seu desenvolvimento e que [...] sua história local revelada no registro arqueológico é de uma lenta deterioração. Disse também que uma origem fora da Amazônia no noroeste da América do Sul, [...] está de acordo com a evidência para a ocorrência generalizada de um nível similar de desenvolvimento sociopolítico nas áreas dos Andes e Caribe (Meggers, 1987).
Anna Roosevelt, em seu livro Parmana (1980), faz uma crítica ferrenha à teoria de Meggers e Evans, afirmando que a cultura Marajoara teria sim se desenvolvido na Amazônia, mas não foi feliz ao afirmar que a principal fonte de proteína dos indígenas estava baseada na cultivação do milho, pois segundo ela boa parte da superfície de Marajó é composta de sedimentos profundos e ricos [...] os solos são bem supridos com elementos nutrientes para plantas [...] o potencial agrícola dos solos das planícies inundáveis de Marajó é, portanto, significativo (Roosevelt, 1989), o que é uma incoerência, pois é sabido que os solos da ilha são pobres e frágeis, assim, de certa forma, impossibilitando o desenvolvimento de uma complexidade sociopolítica baseada somente na agricultura.
Já Denise Pahl Schaan, contribuiu ricamente para a elucidação desta questão quando estudou o sítio arqueológico onde uma vez existiu o Cacicado dos Camutins que se desenvolveu baseado principalmente nos recursos aquáticos. Ela afirma que a razão maior para o não-desenvolvimento de uma agricultura intensiva não seria a pobreza dos solos, mas a abundância dos recursos aquáticos, que proporcionavam uma fonte de alimentos mais confiável, que poderia ser explorada com baixo investimento de trabalho (Schaan, 2006). E é ainda mais contundente ao afirmar que a intensificação da captura de recursos aquáticos pode ter estado na base do desenvolvimento de cacicados em toda a bacia Amazônica no período que antecedeu a conquista, em vez de uma agricultura intensiva (Schaan, 2006). O que a nosso ver parece ser a assertiva mais correta.

           
5 Conciderações Finais

            De acordo com os dados obtidos no decorrer das pesquisas, ficou claro que os indígenas da Ilha de Marajó sabiam manejar as águas dos rios a seu favor, construindo lagos artificiais, conectados ao rio, que tinham capacidade de reter recursos aquáticos que são abundantes na região. Isto posto, acreditamos que o surgimento da complexidade social na Ilha de Marajó teria sido impulsionada muito mais pelo desenvolvimento de uma pesca intensiva que pela agricultura, assim, podendo até mesmo sugerir o seguinte modelo para entender outros cacicados da ilha: uma sociedade hierárquica e estratificada, dividida em nobres e comuns, com economia baseada na pesca intensiva, poder nas mãos de uma linhagem que se colocava como descendente de deuses, utilização da ideologia e controle sobre a religião para justificar a estratificação social, mobilização de trabalho para a construção das obras de controle hidráulico, especialização do trabalho não muito desenvolvida, mas tendo por base gênero, idade e posição social; guerra, competição, trocas e alianças de casamento teriam caracterizado as relações entre os cacicados.


6 Bibliografia Consultada

BALÉE, William. Culturas de Distúrbio e Diversidade em Substratos Amazônicos. Revista de Arqueologia, 21, 2008.

______________. Sobre a Indigeneidade das Paisagens. Revista de Arqueologia, 21, 2008.

CARNEIRO, Robert L. A Base Ecológica Dos Cacicados Amazônicos. Revista de Arqueologia, 20, 2007.

CUNHA, Manuela Carneiro. História dos Índios no Brasil, 2008.

MEGGERS, Betty J. Environmental Limitation of the development of culture. American Anthropologist, 1954.

________________. The early history of man in Amazonia. Claredon Press, 1987.


NEVES, Walter Alves. Antropologia Ecológica: um olhar materialista sobre as sociedades humanas. Cortez Editora, 2002.


ROOSEVELT, Anna C. Parmana: Prehistoric maize and manioc subsistence along the Amazon and Orinoco. New York, Academic Press, 1980.

___________________. Lost civilizations of the lower Amazon. Natural History, 1989.


SCHAAN, Denise Pahl. Marajó: Arqueologia, Iconografia, História e Patrimônio. Pueblos y Paisajes Antiguos de La Selva Amazónica, 2006.